Os Melhores Filmes de 2019

Como já coloquei noutros textos deste blog, sempre resisti à ideia de fazer este tipo de lista dos “melhores”. Achava q isso não serviria para praticamente nada, apenas um exercício de vaidade pública. Mudei de ideia, hj penso q pode ser apenas uma troca de experiências e sensações, prazerosa e despretensiosa.

Listar os melhores filmes sempre provoca justos questionamentos, como: “Faltou tal filme!!”. Enfim, só o q sempre resta é fazer algo pessoal. Então, o critério aqui será: os 12 q mais me <strong>afetaram</strong>, <strong>impactaram</strong>. Não vou discutir aspectos técnicos, nem qualidade artística do diretor ou das atuações, especificamente. Tudo ficará incluído nesta categoria escolhida, nomeada “afetação/impacto/atravessamento”. Também não vou me preocupar caso a data exata de lançamento fora do Brasil for de um ano anterior. Por último, “Por que 11 filmes e não 10, ou 15?”: pq este número acabou sendo resultado dos q não consegui excluir. Os restantes q também adorei estão na Grande Lista (ler mais no post <strong>”Grande Lista de Filmes (atualizada constantemente)”</strong>, aqui neste blog.

Sem mais delongas, aqui vão os 11, em ordem de afetação:

1) “Coringa”: Obra-prima, o melhor filme do ano. Coringa poderia ser qualquer cidadão, um João Ninguém sonhador. Mas, para além dos enormes ganhos comerciais, propor um anti-herói q poderia ter sido irmão bastardo do Batman coube bem enquanto alegoria. O poder ilimitado invoca os excessos, de ódio, desprezo, arrogância. A onipotência de um milionário instiga a onipotência reativa de um oprimido. “Jogos de poder”, diria Foucault. Joaquin Phoenix atua à perfeição (já merecia um Oscar desde o maravilhoso “Ela”), e a direção e roteiro de Todd Phillips azeitam cada detalhe, evidenciando q um filme hollywoodiano pode ser pura arte.

2) “Assunto de Família”: Excelente!! Sensibilidade ímpar, beleza rara. O retrato de uma “família”, onde o afeto é o protagonista, e os adultos ensinam “o q sabem”, para além das óbvias implicações educacionais para as crianças. Muito para além do maniqueísmo do politicamente correto, o grande diretor japonês Hirokazu Kore-Eda (do duríssimo e também excelente “Ninguém Pode Saber”) apresenta um drama inequivocamente comprometido com as verdades do submundo da miséria, as leis do cotidiano q vive a despeito de políticos, policiais e assistentes sociais. A transgressão aqui corresponde não apenas ao risco, a um posicionamento na contracultura, ou a uma glamourização do poder vivenciado pelo transgressor, mas sim a uma saída pró-Eros, uma resistência sem retóricas, uma assunção do afeto como lei central, custe o q custar (como a discussão de Almodóvar em “Fale com Ela”). Atuações brilhantes, imperdível. Ver mais no post “Só o Afeto Interessa (‘Assunto de Família’)”, aqui neste blog.

3) “Dor e Glória”: Almodóvar, finalmente, está de volta. 16 anos após realizar seu último grande filme (“Má Educação”), o gênio reacessa seus grandes momentos na carreira. Antonio Banderas – bem como protagonista, porém não brilhante para merecer o prêmio conquistado em Cannes – vive uma espécie de alter ego do diretor, com o início de sua velhice remetendo às deliciosas memórias de sua infância. A relação com sua mãe, os primeiros instantes de seus desejos homossexuais, o início de seu amor pela arte e pela intelectualidade. Antimaniqueista de ponta a ponta, a biografia do cineasta atravessa seu vazio atual, suas somatizações e sua solidão, bem como suas deliciosas lembranças, e seu potencial de vitalidade. Mais do q uma exposição dos bastidores do Cinema, o filme aborda o cotidiano comezinho, criativo e também às vezes simplório de uma pessoa comum, apesar de sua genialidade. Se não atinge seu ápice (a obra-prima “Fale com Ela”), Almodóvar chega perto disto, com este retorno magistral a si mesmo.

4) “O Bar Luva Dourada”: Incrível. Pesadíssimo, especialmente nos primeiros 15 minutos. O filme não aborda os assassinatos de um psicopata com glamour, nem a investigação ou perseguição policial. A história é sobre o submundo do protagonista e das vítimas, em especial no tal bar e na casa do serial killer. Atuação magistral de Jonas Dassler, digna de todos os prêmios possíveis (após verem o filme, vale conferir o rosto do ator, como se transformou). O diretor Fatih Akin (do maravilhoso “Tschick”) expõe a sujeira física e emocional dos personagens em seu cotidiano, bem pr’além das mortes, transmitindo à perfeição cada detalhe, quase até o cheiro dos lugares. Atmosferas de tensão, medo, indiferença e até humor negro são mostradas brilhantemente, pelo trabalho de altíssimo nível dos atores coadjuvantes, criando personagens marcantes, inesquecíveis. cinema da mais alta qualidade, pra quem tiver estômago.

5) “Um Dia de Chuva em Nova Iorque”: Mais uma obra-prima de Woody Allen, um dos maiores diretores de todos os tempos. Como em seus melhores filmes, seu roteiro e suas frases são “simples” e brilhantes. As reviravoltas amorosas, o antimaniqueísmo são marcas constantes, desconstruindo os valores relacionais culturalmente viciados. Gostem dele ou não, só não é aceitável q se reduza sua filmografia a uma única forma de narrativa (vide “Zelig”, “Tudo que Você sempre Quis Saber sobre Sexo mas Tinha Medo de Perguntar”, “Poderosa Afrodite”, etc).

6) “Entardecer”: Brilhante. Uma complexa rede de mistérios acerca do passado de uma mulher, na Budapeste nos anos anteriores à Primeira Guerra. Câmera brilhantemente grudada em seu olhar, refletindo o absurdo e o vazio de informações à sua volta. A protagonista funciona como um fantasma para todos, como se estivesse num mundo paralelo, e vice-versa. Num misto de “O Homem sem Passado” (Kaurismäki) com “O Anjo Exterminador” (Buñuel), o diretor alcança um raro resultado q provoca reações de drama, suspense e policial no espectador. Impressionante.

7) “O Anjo”: Maravilhoso! Um thriller policial construído magistralmente pelo diretor e roteirista Luis Ortega. Na linhagem dos inesquecíveis “Butch Cassidy” e “Bonnie & Clyde”, o filme narra a trajetória de um doce e perverso (no sentido psicanalítico) jovem ladrão, numa escalada de roubos e ocasionais violências. Pasolini teria se apaixonado por este ator/personagem, de sexualidade quase tão aberta e sedutora quanto no clássico “Teorema”. Divertido, intenso, consistente, redondo. Imperdível.

8) “Ayka”: Pesadíssimo e excelente. O trágico e hiper realista cotidiano de uma imigrante cazaque na Rússia, logo após abandonar seu filho recém-nascido. Em q pese 1 ou 2 exageros (obscenidades realísticas), a lucidez é convocada sem perdão. Para os espectadores mais disponíveis à crueza da miséria. Um dos melhores filmes do ano.

9) “Estou me Guardando para quando o Carnaval Chegar”: Excelente! A direção de Marcelo Gomes (da obra-prima “Cinema, Aspirinas e Urubus”) extrai arte pura de cada detalhe da cidade de Toritama, interior de Pernambuco. O crescimento da cidade é filmado à perfeição, através do processo de consecução de jeans, produto responsável por uma revolução ali. Onde antes tudo era rural – agricultura e pecuária de subsistência -, agora são trabalhadores, a maioria autônomos ou ganhando por bônus de produtividade. Em q pese a óbvia crítica às explorações do Capitalismo, os personagens deste doc assumem suas escolhas, e ainda circulam todo o ganho no sonho do Carnaval nas lindas praias de Alagoas. Imperdível.

10) “Três Faces”: Excelente! Uma aula sobre histerias (Freud), através do olhar extremamente sensível do aclamado e perseguido político Jafar Panahi. O diretor e protagonista viaja com uma amiga atriz em busca de uma jovem admiradora desta, q teria tentado suicídio. Intenso e divertido, leve e verdadeiro, tudo ao mesmo tempo. Aula de cinema.

11) “White Boy Rick”: Excelente! A história real de um jovem de 15 anos q se torna informante da polícia federal americana, infiltrado numa gangue de traficantes de drogas. Intenso e atuado de forma brilhante pelo garoto (Richie Merritt) e seu pai (o fora-de-série Matthew McConaughey).