Melhores Filmes em Cartaz (atualizado constantemente)

1) “Coringa”: Obra-prima, o melhor filme do ano. Coringa poderia ser qualquer cidadão, um João Ninguém sonhador. Mas, para além dos enormes ganhos comerciais, propor um anti-herói q poderia ter sido irmão bastardo do Batman coube bem enquanto alegoria. O poder ilimitado invoca os excessos, de ódio, desprezo, arrogância. A onipotência de um milionário instiga a onipotência reativa de um oprimido. “Jogos de poder”, diria Foucault. Joaquin Phoenix atua à perfeição (já merecia um Oscar desde o maravilhoso “Ela”), e a direção e roteiro de Todd Phillips azeitam cada detalhe, evidenciando q um filme hollywoodiano pode ser pura arte.

2) “O Farol”: Obra-prima, soberbo. Muito superior ao seu filme anterior (“A Bruxa”, muito bom, mas com problemas), o diretor aqui entra para o grupo de grandes da atualidade. Inspirado no noir hiper claustrofóbico de Ingmar Bergman, com pássaros de Hitchcock, entre outras referências, Robert Eggers conduz o brilhante Willem Dafoe e o aqui muito bom Robert Pattinson num erotismo pré-sexual à iminência de um ataque de nervos. O suspense psicológico, com micro toques de fantasia, acerta de ponta a ponta. Premiado na Semana da Crítica em Cannes 2019.

3) “Um Dia de Chuva em Nova Iorque”: Mais uma obra-prima de Woody Allen, um dos maiores diretores de todos os tempos. Como em seus melhores filmes, seu roteiro e suas frases são “simples” e brilhantes. As reviravoltas amorosas, o antimaniqueísmo são marcas constantes, desconstruindo os valores relacionais culturalmente viciados. Gostem dele ou não, só não é aceitável q se reduza sua filmografia a uma única forma de narrativa (vide “Zelig”, “Tudo que Você sempre Quis Saber sobre Sexo mas Tinha Medo de Perguntar”, “Poderosa Afrodite”, etc).

4) “Uma Mulher Alta”: Excelente. Atuações soberbas, cenário primoroso. O diretor russo Kantemir Balagov constrói os personagens à perfeição, em meio a um esfacelamento emocional pós-2a Guerra. Sobrevivência, sexualidade, inibições, transgressões: um oceano de sutilezas marejadas pela fragmentação subjetiva imposta de forma generalizada.

5) “O Paraíso Deve Ser Aqui”: Excelente. O diretor e protagonista Elia Suleiman (da obra-prima “O que Resta do Tempo”) apresenta seu estilo único, tragicômico, contemplando silenciosamente cada micro absurdo do cotidiano das culturas da Palestina, Paris e Nova Iorque. Representante da Palestina no Oscar 2020, o q já é impressionante, e símbolo central da proposta do filme. Destaque para a cena das previsões das cartas para o futuro da Palestina. Menção Especial no Festival de Cannes 2019.

6) “Adam”: Excelente. O drama de uma mulher solteira, grávida e desempregada no Marrocos. Sua única chance seria abandonar sua família sem q descobrissem a gravidez, arrumar algum bico e qualquer moradia até q o bebê nascesse e doá-lo. Só assim poderia voltar a uma vida “digna” (tendo em vista os fortes preconceitos machistas daquela sociedade) e se casar “normalmente”. Para isto, tenta não se apegar ao filho q está para nascer. É acolhida por uma jovem viúva (envelhecida pelo luto e por seus sintomas obsessivos), com uma filha pequena. A leveza “histérica” (no sentido freudiano, não no sentido vulgar de gritaria ou descontrole) da visitante colore a melancolia acinzentada da anfitriã, sob mediação da resistência otimista da filha (alusão ao “bebê sábio” do grande psicanalista Sandor Ferenczi).

7) “Bacurau”: Ótimo! Os excelentes diretores Kleber Mendonça Filho (da obra-prima “O Som ao Redor”) e Juliano Dornelles realizam um filme com ação atípica no panorama nacional. Como nos filmes anteriores, Kleber revela sua maestria no cenário, na caracterização da cidade. Suas discussões políticas destacam o tom patético da demagogia do poder econômico (no caso, o prefeito), plenamente percebida pelo povo, q se posiciona enfaticamente. Frases como “Bacurau tem q pagar pra entrar no mapa do país?” denunciam os absurdos, bem como a resistência popular, dentro do possível (destaque para a importância do Museu de Bacurau, metáfora central no filme). As atuações estão ok, não brilhantes. As comparações com o estilo do Tarantino não me parecem tão precisas, pois apesar da violência e do humor negro, as propostas de cada um soam bastante diferentes. Prêmio do Júri no Festival de Cannes.

8) “Parasita”: Ótima alegoria sobre as enormes disparidades entre a burguesia e o proletariado. Uma família pobre q vive num porão infiltra-se aos poucos na casa de uma família rica. O diretor explora com bastante precisão, acidez e ironia a fragilidade da bolha da classe alta, através da necessidade de uma “indicação de confiança”, para contratar alguém para algum serviço em casa. Lentamente, o drama vai ganhando tons de suspense e tragédia, expostos através de uma grande enchente q evidencia ainda mais o absurdo das castas do nosso cotidiano.

9) “Os Miseráveis”: Muito bom. Thriller policial intenso, vencedor da Palma de Ouro em Cannes em 2019. Atuações excelentes, ambientação precisa sobre a miséria. No entanto, soa como um plágio de uma obra-prima chamada “O Ódio”, com Vincent Cassel. “Os Miseráveis” não chega perto da qualidade e da verossimilhança do outro filme. As trucagens forçadas e as soluções apressadas fazem a película perder qualidade. Ainda assim, vale o ingresso. Prêmio do Júri no Festival de Cannes 2019.

10) “Era uma Vez em… Hollywood”: Bom. Talvez seja o filme menos surpreendente e menos marcante de Quentin Tarantino, porém não deixa de trazer toques de cinema refinado, humor sátiro e belas atuações.

11) EXTRAS IMPERDÍVEIS:
11.1) “Cinema, Aspirinas e Urubus” (na Mostra “Festival do Rio – 20 anos”)

15 Melhores Filmes Brasileiros de Todos os Tempos

Sempre resisti à ideia de fazer este tipo de lista dos “melhores”. Sempre achei q isso não serviria para praticamente nada, apenas um exercício de vaidade pública. Mudei de ideia, hj penso q pode ser apenas uma troca de experiências e sensações, prazerosa e despretensiosa.

Listar os melhores filmes sempre provoca justos questionamentos, como: “Faltou o Glauber!!”, “Sem Nelson Pereira dos Santos não faz sentido.”. Enfim, só o q sempre resta é fazer algo pessoal. Então, o critério aqui será: os 15 brasileiros q mais me afetaram, impactaram. Não vou discutir aspectos técnicos, nem qualidade artística do diretor ou das atuações, especificamente. Tudo ficará incluído nesta categoria escolhida, nomeada “afetação/impacto/atravessamento”. Por último, “Por que 15 e não 10, ou 50?”: pq este número acabou sendo resultado dos q não consegui excluir. Os restantes q também adorei estão na Grande Lista (ler mais no post “Grande Lista de Filmes (atualizada constantemente)”, aqui neste blog.

Sem mais delongas, aqui vão os 15, em ordem de afetação, c/ breves comentários:

1) “Janela da Alma”: Maravilhoso, poético, irretocável. João Jardim e Walter Carvalho dirigem Wim Wenders, Saramago, Manoel de Barros, Oliver Sacks, Hermeto Pascoal, João Ubaldo, etc. Emocionante, depoimentos extremamente inteligentes e sensíveis.

2) “Vinícius”: Além de Vinícius de Moraes ser um poeta dos maiores, o diretor Miguel Faria Jr. apresenta de forma preciosa sua história, parceiros, idiossincrasias, polêmicas, intensidades. Inúmeras falas inesquecíveis, como as de Ferreira Gullar, Maria Bethânia, Chico Buarque e Tonia Carrero. Além de interpretações tocantes de suas músicas, como a de Mônica Salmaso. O único senão é a presença tosca da fraquíssima Camila Morgado.

3) “Elena”: Obra-prima de máxima sensibilidade de Petra Costa, a melhor diretora brasileira. Filme radicalmente autoral, para além de ser um doc autobiográfico. O atravessamento de sua dor pela perda da irmã Elena é vivido visceralmente, sem concessões, até q possa, enfim, voltar a respirar. Petra filma à perfeição, tanto dor, quanto amor, melancolia (da mãe) e a própria sublimação de seu fantasma.

4) “Moscou”: A obra-prima máxima do melhor documentarista do Brasil, e um dos mais importantes do mundo: Eduardo Coutinho. Seguindo a potência de seu filme anterior “Jogo de Cena”, outra obra-prima, o diretor aprofunda sua criatividade e sensibilidade artística filmando o Grupo Galpão de teatro ensaiar uma peça de Tchekhov, q nunca seria exibida ao público. Os atores se revezam ensaiando papéis diferentes, o q provoca um jorro de afetação no espectador, pois este recurso lança cada personagem com muito mais força, transmitido por mais de um ator. Incrível.

5) “Ônibus 174”: Excelente doc de José Padilha, um de nossos melhores diretores. Contundente, sério e minucioso. A tragédia do sequestro de um ônibus na Zona Sul do Rio de Janeiro sendo contada de forma a retratar a “invisibilidade” dos meninos de rua, e os horrores de suas história de vida. O sequestrador, na infância, assistiu à sua mãe ser degolada na porta de sua casa, e anos depois esteve entre os meninos da chamada “chacina da Candelária”, onde 8 adolescentes foram gratuitamente assassinados por policiais militares. No filme, destaque para a cena em q o sequestrador, mesmo drogado, liberta um jovem universitário, para q este possa estudar.

6) “Moacir – Arte bruta”: Extremamente sensível. O diretor Walter Carvalho atinge a perfeição ao trazer um retrato tocante de um artista q contrariou o “pensamento” preconceituoso de sua vila (São Jorge), para inscrever suas pinturas no cenário mundial (foi descoberto por turistas alemães). Seus temas – sexualidade e diabos – causam horror na hipocrisia daquela sociedade, q quase consegue encarcerá-lo, literalmente. A sensibilidade de seu pai e de um ou outro na vila acabam por sustentar seus direitos humanos. Sua mãe, psicotizante, enfiava concretamente seu peito no garoto (Moacir tinha então 2 anos), quando este já não aceitava mais.  É um homem da resistência, surdo de um ouvido, analfabeto e fanho, mas mais belo e forte do q a maioria das pessoas q já conheci. Já utilizei este filme várias vezes em aulas sobre a potência da psicose. Cheguei a visitar o próprio Moacir em São Jorge (Goiás), e encontrei um cenário triste: uma doença degenerativa o impede de continuar pintando. Terrível… Ainda assim, ele foi super gentil. Eternamente um resistente.

7) “Separações”: O melhor de todos os filmes de Domingos Oliveira, um dos melhores diretores brasileiros. Com um escracho generalizado um tanto à la Woody Allen, o humor deste filme é ímpar. Reviravoltas com simplicidade e inteligência nos diálogos, Domingos arrasa todo e qualquer maniqueísmo, trazendo o desamparo e as tentações com igual intensidade entre homem e mulher. O respeito não panfletário à igualdade grita nos conflitos e agonias poéticas e histriônicas dos personagens, flertando com o patético mas encerrando na beleza demasiadamente humana dos casais.

8) “O Invasor”: Belíssimo e extremamente preciso trabalho do diretor Beto Brant. Um tratado de Psicanálise sobre a relação da Neurose com a Perversão. Paulo Miklos (da banda “Titãs”) atua à perfeição como um matador q resolve “frequentar” a firma de 2 sócios q o contrataram para matar o terceiro. Falas inesquecíveis, olhares e tensões de poder minuciosamente colocados. Obra-prima irretocável.

9) “Nome Próprio”: O diretor Murilo Salles atinge o brilhantismo nesta obra impressionante, com um título perfeito. O nomadismo da protagonista incomoda o público, causando em muitos a sensação de q as escolhas da personagem seriam bizarras. Sua liberdade – não glamourizada – evidencia os aprisionamentos até dos espectadores menos preconceituosos. Virtuosismo notável da direção. Ler mais no post “Estilo X Pejorativismo (sobre ‘Nome Próprio’)”, aqui neste blog.

10) “O Cheiro do Ralo”: O maior trabalho da vida de Selton Mello, um dos melhores atores brasileiros (chego a considerar q este filme, especificamente, não seria possível com outro ator). Articular traços psicóticos e perversos num único personagem – tarefa praticamente impossível – foi o q o diretor Heitor Dhalia conseguiu realizar, com precisão impressionante, na parceria com Selton.

11) “Jogo de Cena”: Mais uma obra-prima do diretor Eduardo Coutinho. “Documentário” sobre as histórias de vida de algumas personagens, apresentadas subsequentemente pelas próprias, por algumas atrizes conhecidas – as brilhantes Marília Pêra, Fernanda Torres e Andréa Beltrão – e outras desconhecidas. Essa “bagunça” desconstrutiva provoca com bastante intensidade a desorganização do espectador. Ficam, entre outras, as questões: o q é o autêntico? O q é ficção? Estes são pontos bastante centrais na filmografia do mestre Eduardo Coutinho.

12) “Doutores da Alegria”: Documentário belíssimo e extremamente emocionante da diretora Mara Mourão, sobre o grupo de palhaços q criaram um trabalho dificílimo com crianças portadoras de câncer. Minuciosamente, os palhaços pensam cada sutileza – a entrada e a saída do quarto, a recusa da criança, a função do nariz vermelho, da música -, inclusive fazendo um grupo de estudos de filosofia, discutindo Spinoza, etc. A sensibilidade e a inteligência dos integrantes do grupo é absurda. A chorar muitas lágrimas de dor e alegria…

13) “Dzi Croquettes”: Excelente documentário dos diretores Raphael Alvarez e Tatiana Issa, sobre o grupo de teatro e dança multi performático. O tema sexualidade era exposto radicalment –  para além da chamada “opção sexual”. A intensidade e genialidade dos membros fez com q não sofressem praticamente nenhuma repressão na época da ditadura. Criativo ao extremo na transmissão da arte. Destaque para os depoimentos de Liza Minnelli e Miéle.

14) “O Som ao Redor”: Filme extremamente denso, desviando nossa atenção dos eixos viciados do nosso olhar, para outras perspectivas. Para além do silêncio – já bastante bem explorado na história do cinema -, o diretor Kleber Mendonça Filho de fato mira o entorno do cotidiano. E o faz com rara qualidade, insistentemente, até q nos desapegamos em definitivo de nossas tendenciosas perspectivas anteriores. A história, geralmente central, fica deslocada para a margem.

15) “Tropa de Elite”: Poderia ser apenas um filme policial intenso e dinâmico, mas vai muito além. Multifacetada trama de costumes, apresenta uma perspectiva de bastidores do sistema policial brasileiro. Com precioso senso de humor, imortalizou bordões como “Quer rir, tem q fazer rir, mano!”, “Quer me fuder, me beija!” e “Cada cachorro q lamba sua caceta!”. Algumas críticas de superficialidade maniqueísta acusaram o diretor José Padilha de traçar um perfil tendencioso pró BOPE, ao q ele retrucou: “Quando fiz ‘Ônibus 174’, disseram q sou pró bandidagem; agora, com o ‘Tropa’, dizem q sou pró polícia. Acho q sou esquizofrênico.”. Pra completar, a ótima atuação de Wagner Moura.